Equipamento recém-chegado demora 10 milhões de anos para atrasar 1 segundo
POR CRISTINE GERK
Rio - Olhando assim, parece só uma caixa preta no subsolo do Observatório Nacional, em São Cristóvão. Mas, dentro daquela enorme bugiganga de 200 kg, átomos de hidrogênio e de quartzo passam por reações químicas que vão culminar no famoso Horário de Brasília, 100% carioca! Há um mês, funciona no Rio o relógio mais preciso da América Latina.
A maioria das pessoas não sabe, mas é daqui que sai a hora exata usada na Bolsa de Valores, em bancos e no Supremo Tribunal Federal. Por um minuto de atraso, um brasileiro pode ser obrigado a pagar uma multa ou cumprir pena judicial. Se o ponteiro estiver equivocado, a aposta em ações da Bovespa capaz de render milhões de reais pode ser perdida. Aviões, navios e celulares também dependem da exatidão criada no subsolo de São Cristóvão.
A supermáquina fica protegida em sala especial, com temperatura e umidade constantes. Ela funciona à base de hidrogênio e demora 10 milhões de anos para atrasar ou adiantar um segundo. Enquanto isso, nosso reloginho de pulso oscila 12 minutos por ano, só porque entramos e saímos do ar-condicionado.
Graças a essa engenhoca, o País entrou num dos patamares de hora mais precisa do mundo. O novo relógio veio dos Estados Unidos com investimento de cerca de R$ 430 mil da Financiadora de Estudos e Projetos, que destinou R$ 1 milhão para monitorar o tempo no Brasil. E o responsável por manter tudo funcionando é fã do tique-taque desde pequeno. O hobby dele na infância era ligar para a rádio-relógio para monitorar a hora exata.
“Nós somos ao mesmo tempo senhores e escravos do tempo. Um segundo que passou não se repete jamais. Quem tem um relógio sabe que horas são, quem tem dois já não sabe mais”, filosofa Ricardo de Carvalho, chefe do Serviço da Hora do Observatório Nacional.
E Ricardo tem razão. Até a polícia às vezes bate na porta do Observatório para conferir a hora na tentativa de desvendar crimes. “Há casos clássicos de como um segundo mudou tudo. Lembra o GP do Brasil de 2002, quando Pelé olhou para o lado e perdeu a bandeirada dos campeões?”, resgata Ricardo. E ele dá a dica: quem também gostar de acompanhar a hora certa pode ligar para 2580-6037 e ouvir o que a megamáquina está marcando.
Nas ruas, uma cidade parada no tempo
O Rio de Janeiro é uma cidade de contrastes e, com a medição do tempo, não poderia ser diferente. Enquanto o relógio mais preciso do mundo segue seu trabalho em São Cristóvão, há analógicos espalhados pela cidade atrasados ou parados.
Na R. Dias da Cruz, no Méier, os ponteiros pararam nas 12h40 há 3 anos, segundo os moradores. “Esses relógios de rua me confundem”, reclama o comerciante Artur Augusto, 50. Na antiga estação de trem da Leopoldina, a hora estacionou nas 19h55. “Não tenho relógio de pulso pois compro em camelô e toda hora estraga. Me guio pelo da Central”, confessa Kely Tiziano, 20. Para sorte dela, o marcador mais famoso do Rio foi consertado e agora tem a hora certa. O mesmo ainda não aconteceu na Glória.
O relógio público não cansa de marcar 18h. A Secretaria de Conservação e Serviços Públicos fará levantamento para definir a programação de atendimento dos relógios públicos. O órgão busca parceiros para ajudar na manutenção desses equipamentos.
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