domingo, 9 de março de 2008

Ano-Bissexto - Aniversário na data certa

ANO BISSEXTO

Uma história que remonta aos tempos do papa Gregório XIII

Nelson Travnik*

Depois de três anos,os nascidos no próximo dia 29 de fevereiro poderão enfim comemorar o aniversário na data certa. É o segundo ano bissexto do século XXI.

O ano de 2008 terá pois 366 dias. Para a maioria não significa nada em especial. Contudo para um pequeno grupo,além de lembrar algumas superstições,chegou enfim a hora de festejar o aniversário no dia certo. Há três anos não aparecia na folhinha o dia 29 e a única opção era escolher o dia 28 ou 1º de março. Aniversariando de quatro em quatro anos,as brincadeiras dos amigos acrescentam que a velhice para esses só chega após os 240 anos! A par dessa gozação,surgem alguns problemas com documentos e por isso as crianças que nascem no dia 29 são registradas na data anterior ou posterior. Muitas pessoas tem medo do ano bissexto porque acreditam que acontecem sempre calamidades e sofrimentos.

COMO SURGIU ?

O ano bissexto surgiu em Alexandria, Egito,em 238 a.C. durante a monarquia helenística de Ptolomeu III (246 -222 a.C.). Foi estabelecido a adição de mais um dia a cada quatro anos para compensar o excesso das 6 horas na duração do ano já por eles calculada de 365 dias. Em razão de uma serie de fatores,quase 200 anos depois foi necessário proceder reforma no calendário.

A INTERVENÇÃO DE JÚLIO CÉSAR

No ano 46 a.C. foi feita uma reforma no calendário por Júlio César (100-44.C.) isto porque o calendário romano havia-se transformado num caos completo depois que os sacerdotes passaram a operá-lo com fins políticos. Júlio César apoiado então nos conselhos do astrônomo grego Sosígenes,resolveu implantar novas regras para o calendário. Este passou a considerar o ano,a exemplo dos egípcios,regulado unicamente pelo Sol com uma duração média de 365,25 dias ou 365 dias e 6 horas. Também para apurar esse excesso de 6 horas,instituiu-se um ciclo de quatro anos,os três primeiros de 365 dias e o quarto de 366 dias. Para promover o acerto que se fazia necessário,o ano da reforma teve 455 dias e foi chamado o "ano da confusão". Para acrescentar o dia suplementar,Júlio César escolheu o mês de fevereiro que além de ser o mais curto com 28 dias,era o último mês do ano entre os romanos que o consideravam um mês nefasto. A designação bissexto estava associado às crendices relativas às influências dos números pares e ímpares. No calendário Juliano,assim chamado em homenagem a Júlio César,seria bissexto o ano divisível por quatro. No inicio tudo funcionou bem mas depois de algum tempo sobrevieram erros gritantes e isto porque não se conhecia com precisão a duração do ano trópico que é de 365,2422 dias ou 365 dias,05 horas, 48 minutos e 14 segundos. Disto resultou ao longo dos séculos uma diferença acentuada que impunha novas regras para o calendário.

A REFORMA PAPAL

O calendário Juliano foi adotado por mais de 16 séculos. No ano 730 d.C. o monge de nome Beda,constatou no Concilio de Nicéia que o calendário Juliano estava errado e no fim de 128 anos ocorria um atraso de um dia em relação ao inicio efetivo das estações. Isto devia-se ao fato de que a duração media de 365,25 dias do ano Juliano como vimos,não apresentava a precisão do ano trópico. As diferenças para o inicio das estações ficavam cada vez mais acentuadas. Em 400 anos do calendário Juliano as estações adiantavam-se três dias. O ano trópico de 365,2422 dias baseia-se no movimento anual do Sol em relação as estrelas fixas ao longo da eclíptica quando cruza periodicamente o equador celeste fato que define as estações. Os erros acumulavam-se cada vez mais e alguém tinha que fazer alguma coisa. E este alguém foi o papa Gregório XIII que convocou o astrônomo e médico napolitano Luigi Lilio (1510-1576) e depois o matemático jesuíta alemão Cristophorus Clavius (1537-1612). Baseado nas regras elaboradas por esses dois cientistas o papa editou a bula "Intergravíssimas" de 24/02/1582,decretando a reforma do calendário. Essa reforma que deu origem ao calendário que utilizamos até hoje constituiu-se no seguinte :

1º-diminuiu-se de dez dias o ano de 1582.A quinta-feira 04 de outubro,pás-

sou para a sexta-feira dia 15.Assim a partir de 1583 o equinócio da pri-

mavera para o hemisfério norte voltou a cair no dia 21 de março;

2º-os anos terminados por dois zeros só seriam bissextos quando múltiplos

de 400;

3º-os dias do mês deixavam de ser contados por calendas,nonos e idos,pás-

sando a ser designados pelos números cardinais : 1,2,3 etc.

Com a distribuição dos anos bissextos em final de século,ficou sanado o erro de três dias que se acumulavam no fim de 400 anos pelo calendário Juliano. Mesmo o calendário gregoriano não é perfeito e apresenta um excesso de 0,0003 dias em relação ao ano trópico o que dá 1,132 dias em quatro mil anos. Este excesso na aproximação de 0,0003 + 3/10000 significa que em 10 milênios o equinócio terá três dias de antecedência. Isto tem levado alguns organismos a pensar em um novo calendário mas por enquanto essas tentativas não vingaram e parece que o atual calendário ainda vai permanecer por longo tempo.

EM BUSCA DA PRECISÃO

Se a diferença de um dia a cada quatro mil anos é importante na datação de fatos históricos,em astronomia,ciência espacial e cálculos relativísticos, tal é inadmissível. Para medir o tempo com a máxima exatidão,foram criados os relógios atômicos. O de 'maser de hidrogênio' possui a precisão de um segundo a cada 10.000 anos. Em São Carlos,SP, o físico Vanderlei Bagnato da USP está construindo um relógio chamado de 'fonte atômica' que só vai atrasar o primeiro segundo daqui a 3 bilhões de anos! Por enquanto,apenas a França conseguiu fazer um assim. No Brasil existem atualmente 14 relógios atômicos de rubídio,29 de césio e 3 maser de hidrogênio. Tudo está sob a coordenação do Serviço da Hora do Observatório Nacional,CNPq-MCT do Rio de Janeiro. Se você está interessado em saber a hora oficial do Brasil com precisão de segundo,disque para XX+21-25806037.

TEMPUS FUGIT -- CARPE DIEM

Baseado nessa análise retrospectiva,vemos que tudo está atrelado a duração do segundo que se mostra extremamente importante para avaliação de flutuações que ocorrem no movimento de rotação da Terra. Devido a diminuição da rotação do nosso planeta via marés e no fato da Lua afastar-se de nós quatro centímetros por ano, o efeito acumulativo da diminuição da rotação da Terra cresce proporcionalmente não ao tempo as ao seu quadrado. Isto provoca periodicamente o acerto da duração do segundo pelos relógios atômicos de todo o mundo. Tal verificação está comprovada pela análise dos registros de eclipses totais do Sol e dos sedimentos modulados pelas marés,portanto pelo movimento da Lua. Verificou-se que há 900 milhões de anos o dia durava 18 horas e o ano tinha 480 dias. Esses cálculos mostram que não vale a pena estabelecer uma reforma no calendário pois a diminuição da rotação da Terra se encarregará disso. Perante esses valores,o fluxo do tempo nos escapa e sentimos quão efêmera é a nossa existência. Portanto a máxima acima em latim "Tempus Fugit – Carpe Diem", preconiza sabiamente : 'O Tempo passa célere,foge - Aproveite o dia, o momento'.

O autor é astrônomo nos observatórios municipais de Americana e Piracicaba e exerceu a direção do Observatório Municipal de Campinas no período de 1982 a 1994.

Mais informações: travnik@uol.com.br – telef.32420786

Posted by:
Lucimary Vargas
Além Paraíba-MG-Brasil
observatorio.monoceros@gmail.com

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