Um astrônomo brasileiro que teve acesso ao maior telescópio do mundo descobriu um par de estrelas "siamesas" que estão em órbita uma em torno da outra a uma distância tão próxima que suas superfícies chegam a se tocar.
O sistema estelar binário que ele descreve está em na Grande Nuvem de Magalhães, uma das galáxias próximas à nossa, a 160 mil anos-luz de distância. Leonardo Almeida, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP relatou sua descoberta em um estudo publicado ontem, junto de colegas.
Ainda sem nome informal, o sistema identificado pela sigla VFTS352 é de um tipo extremamente raro. Astrônomos só conhecem outros três desse tipo, no qual uma estela "beija" a outra enquanto ambas rodopiam. Aquele descoberto agora, porém, é o mais maciço conhecido.
As propriedades de VFTS352 foram investigadas com o VLT (Very Large Telescope), de Cerro Paranal, no Chile. O acesso ao instrumento foi possível porque entre o grupo possui um autor da Bélgica, que é país membro do ESO (Observatório Europeu do Sul), dono da instalação.
As estrelas do par identificado por Almeida são grandes, cada uma delas com massa cerca 29 vezes maior que nosso Sol. Ambas giram em torno uma da outra muito rapidamente, com ciclo de um pouco mais de um dia. A distância entre os centros das estrelas é de 12 milhões de quilômetros e sua temperatura é de 40.000 °C, bastante quente em termos astrofísicos.
"Esses números não batem com aquilo que se esperaria da teoria de evolução estelar clássica", afirma Almeida. Já se sabe que a maioria das estrelas de grande massa possuem companheiras, mas as características do sistema não eram esperadas. "Esse objeto deveria ser muito menos quente e muito maior."
Essa diferença pode ser crucial para as previsões sobre o que deve acontecer com a estrela no futuro.
Segundo o cientista, um dos aspectos curiosos sobre o sistema binário que ele descreve é que suas estrelas têm tamanho muito similar. Em sistemas binários nos quais uma estrela é maior que a outra, a grande acaba sugando matéria da pequena, até que ela se esgote. Ocorre então uma fusão, criando uma estrela maior.
No caso do VFTS352, porém, pode ter um destino diferente. É possível que o sistema também venha a se fundir em uma única estrela gigante, mas outra opção seria a de as duas estrelas se lacrarem nesse estado de fusão.
As estrelas viveriam todas as suas vidas nessa configuração, até esgotarem seu combustível nuclear interno e explodirem na forma de supernovas, com emissão fortíssima de raios gama. Nesse caso ambas se tornariam buracos negros orbitando um ao outro.
Essa hipótese só foi delineada recentemente em teorias, e a observação de VFTS352 é uma evidência forte de que esse é um caminho possível para estrelas maciças. Caso a estrela venha a se fundir, diz o pesquisador, é possível que o fenômeno dure algo em torno de 100 mil anos, mas é preciso realizar mais observações para uma estimativa melhor. Sistemas binários de estrelas pequenas podem se fundir em apenas 5 anos a partir do primeiro contato, diz.
Com os dados obtidos até agora, porém, ainda não é possível saber como, se e quando uma fusão ou uma explosão podem acontecer. Dado o caráter inusitado da descoberta, Almeida e seus coautores conseguiram obter tempo no Telescópio Espacial Hubble, da Nasa, para observar a estrela. O grupo está agora analisando os dados obtidos pelo instrumento.
A descoberta de VFTS352, feita em parceira com astrônomos dos EUA, Europa e Chile, está descrita em estudo na revista científica "The Astrophysical Journal".
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