quinta-feira, 3 de abril de 2008

Nova técnica deve permitir detecção de planetas idênticos à Terra


Concepção artística de um planeta como a Terra fora do Sistema Solar (Foto: David A. Hardy/AFP)


A busca por planetas fora do Sistema Solar continua indo de vento em popa -- a ponto até de ser perigoso cravar ao certo quantos já foram descobertos. Ainda assim, os cientistas continuam à procura de um mundo exatamente igual à Terra. Agora, graças a uma nova técnica desenvolvida por uma equipe da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, isso deve mudar.

Claro, ao ler o título do artigo que eles acabam de publicar no periódico científico britânico "Nature", seria difícil de adivinhar qual é a grande sacada: "Um pente de freqüências laser que permite medições de velocidade radial com uma precisão de 1 cm/s". Uau, que empolgante. O cientifiquês quase esconde a notícia. Mas vamos lá, à decifração. Começando pela explicação de como funciona a principal forma usada hoje para detectar planetas fora do Sistema Solar. Como esses astros são muito menos brilhantes do que as estrelas em torno das quais eles giram, é impossível observá-los diretamente. Por conta disso, os cientistas desenvolveram vários métodos indiretos de detectá-los. O mais antigo e difundido deles envolve detectar uma "dancinha gravitacional" que a estrela faz conforme os planetas giram ao seu redor, indo para lá e para cá, conforme seus companheiros rodopiam em torno dela. Pois é, assim como o Sol atrai a Terra e os outros planetas para que eles fiquem girando ao redor dele, os planetas também atraem o Sol, fazendo com que ele execute um ligeiro bamboleio. O maior dos planetas do Sistema Solar, Júpiter, tem apenas um milésimo da massa do Sol, e sua gravidade faz com que a estrela altere sua chamada "velocidade radial" em 10 centímetros por segundo. Ou seja, um ET que estivesse observando o Sol de longe veria a estrela se deslocando ora para longe, ora para perto, alterando sua velocidade em 13 metros por segundo. Até aí tudo bem. Mas como esse ET (ou um astrônomo terráqueo, olhando para outras estrelas) conseguiria perceber se a estrela estava "vindo" ou "indo", e em que velocidade? O segredo está no chamado efeito Doppler. Primeiramente sugerido pelo físico austríaco Christian Doppler, em 1842, ele consiste no fato de que o espectro (a composição de cores da luz) de um objeto muda conforme ele está se afastando ou se aproximando. É como acontece com o som, quando uma ambulância está se aproximando e depois se afastando de nós -- temos a impressão de que o "tom" da sirene muda conforme ela passa por nós e começa a se afastar. No caso do espectro, entretanto, o que acontece é que ele fica mais avermelhado, se o objeto está se afastando, ou mais azulado, se o objeto está se aproximando. Para descobrir alguma coisa ao redor de uma estrela com esse método, os cientistas precisam observar o espectro do astro durante muitos anos e analisar as variações de velocidade radial durante esse período, em busca de padrões que indiquem um bamboleio repetitivo provocado pela presença de um planeta. Foi assim que os primeiros planetas fora do Sistema Solar foram descobertos, em 1995. Desde então, a técnica tem melhorado muito para permitir medições cada vez mais precisas da variação de velocidade radial das estrelas. Hoje, mudanças de até 60 cm/s podem ser detectadas. Mas isso ainda não é o suficiente para encontrar um análogo perfeito da Terra -- um planeta com a mesma massa que o nosso, orbitando quase circularmente uma estrela igual ao Sol, num período anual que seja próximo do nosso. É aí que entra o avanço produzido pela equipe de Chih-Hao Li, do Departamento de Física da Universidade Harvard. Ao desenvolver um arranjo experimental a laser para uso em telescópios, os cientistas acreditam ter encontrado um modo de permitir calibragens muito mais precisas das medições de velocidade radial. Segundo os pesquisadores, essa precisão atinge 1 cm/s. "Para encontrar um planeta de massa terrestre numa órbita como a da Terra, uma precisão de cerca de 5 cm/s é necessária", dizem os pesquisadores, na abertura de seu artigo na "Nature". Ou seja, o tal "astro-pente" desenvolvido por eles (dispositivo que permite a melhoria das medições) deve dar e sobrar. O trabalho é importante por fornecer aos astrônomos uma maneira de melhorar radicalmente suas medições e encontrar planetas menores, que antes passavam despercebidos. Dessa maneira, deve aumentar o conhecimento que se tem da arquitetura dos sistemas planetários -- assunto que ainda é muito pouco compreendido. Mais ainda, o esforço coloca mais uma vez os telescópios em terra em uma condição mais justa de competição com os satélites de pesquisa, que ameaçavam tomar a dianteira na caça aos planetas extra-solares.

Salvador Nogueira, Do G1, em São Paulo

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